Pelo P. Jorge Crisafulli SDB.
Como Salesiano missionário, estou convencido de que a primeira missão da Igreja e da Comunidade Cristã é anunciar a misericórdia; mas não basta pregá-la com palavras. Pregamos a misericórdia e, ao mesmo tempo, somos extremamente duros e rígidos com os pobres, com os “pecadores”, com os ignorantes e com os marginalizados deste mundo.
Aqui, no ‘Don Bosco Fambul’, estamos todos os dias em contato com o sofrimento de todos estss tipos de deserdados. Esta é a história de Alpha.
Há alguns dias, eu dormia profundamente quando às 2, isso mesmo,da madrugada, tocou o telefone. Diante da catedral havia um jovem ensanguentado e desmaiado. Tinha um braço quebrado, o rosto desfigurado pelos socos, uma orelha cortada pela metade e, por todo o corpo, muitas feridas e sinais de pancadas. Rapidamente o levamos ao hospital. As enfermeiras e o médico disseram-nos que, dadas as aparências, devia ser um ladrão surpreendido “in flagrante delicto” e ainda estava vivo por milagre. Aqui, os pequenos ladrões são julgados e condenados à morte na rua.
A enfermeira dizia: “Padre, por que gastar tempo e dinheiro com essa gente? São uma chaga social. Deixe que apodreçam na prisão”. Eu respondi: “Nós do ‘Don Bosco Fambul’ acreditamos nos jovens. Sabemos que há, em cada um, uma fibra de bem e que ‘para Deus nada é impossível’. A sua graça pode fazer num instante, de um ladrão, um santo”. Ela olhou-me incrédula e continuou a costurar a orelha “cortada” com indiferença e, ainda mais, sem anestesia.
Às 5h30 levamos o Alpha, o “ladrão pego”, à nossa casa e lhe demos um prato de comida, medicamentos para diminuir a dor e uma esteira para dormir.
Alpha tem 22 anos, é órfão e tem tuberculose. Já iniciou o tratamento e quer estudar para aprender uma profissão e mudar seu estilo de vida. Hoje, o seu rosto desfigurado voltou ao normal: consegui descobrir muita beleza interior através dos seus olhos. Quando seu braço ficar bom, poderá começar os estudos para aprender uma profissão em uma das oficinas de Freetown e fará o seu processo de reabilitação.
Como dizia Dom Bosco, não há jovens maus. Eles são jovens aos quais ninguém mostrou o potencial de amor e de bondade que há em seu coração. Que diferença existe entre Alpha e eu? Em seus olhos, vejo a mim mesmo, com o seu silêncio está me dizendo implicitamente que no meu coração há também um imenso potencial para o bem e para o mal, para a violência e para a paz, para o egoísmo e para a... dedicação.