Mas antes de me referir mais explicitamente a isto, quero realçar um facto que foi uma verdadeira Graça e Dom de Deus. Na tarde de 12 de setembro passado, recebemos uma chamada a comunicar-nos que o padre Thomas Uhzunnalil tinha sido libertado e estava a chegar a Roma num voo procedente do Sultanato de Omã.
A notícia, após 18 meses de sequestro, meses de esperança e de medo, encheu-nos de alegria. Recebemos o nosso irmão salesiano Thom. Vinha muito fragilizado de forças físicas, tinha perdido 30 quilos, e 38% da sua massa corporal, inseguro no andar porque não tinha podido fazer exercício em todo esse tempo, mas vinha forte no seu espírito, sereno, lúcido, e cheio de paz e serenidade.
Isto levou-me a pensar como Deus é capaz de fazer do mais débil e do mais frágil uma voz da sua presença e da sua força. O padre Thom contava-nos que tinha vivido aqueles 18 meses com serenidade, com muita paz, dando graças a Deus todas as noites pelo dia que tinha vivido -mesmo sem ter podido sair do seu lugar de sequestro nem ver a luz-, e Lhe dizia que, se no dia seguinte chegasse ao fim da sua vida, iria sereno ao seu encontro. O nosso irmão Thom rezava todos os dias pelos seus raptores e pelas suas vidas. Rezava pelas irmãs missionárias da caridade (de Madre Teresa de Calcutá) que tinham sido assassinadas na sua presença. Rezava pelos seus entes queridos, pela sua família salesiana e pelos jovens.
Como não podia celebrar a Eucaristia com pão e vinho, rezava-a todos os dias mentalmente, e isso dava-lhe também uma grande força. Pensava com serenidade e rezava, rezava e pensava serenamente, dominando muito o seu pensamento para que este não lhe complicasse as coisas.
E regressou cheio de paz e serenidade. Sem dúvida cresceu muito na sua interioridade durante esta dolorosa experiência. Não pretende nada, não espera nenhum reconhecimento. Simplesmente continuar a servir e a trabalhar com serenidade.
Falava-nos da sua condição de missionário. Estava no Yémen como missionário e sentiu-se missionário, mais do que nunca, durante estes 18 meses, embora não pudesse ‘fazer nada’, mas na realidade ‘era tudo’, porque todos os dias entregava o que era, com total inocência.
E nesses mesmos dias, enquanto o nosso irmão Thom estava em Roma, outros 21 missionários Salesianos e 13 Filhas de Maria Auxiliadora recebiam o crucifixo do seu envio missionário. Todos com o coração preparado para servir onde forem mais necessários. Deixando o seu mundo conhecido, deixando a proximidade dos seus laços afetivos, para viver acompanhando outros rostos, outras sensibilidades, outras gentes.
E a ponte entre o padre Thom e os novos missionários estava construída. O testemunho do nosso irmão Thom era para estes novos missionários todo um testemunho de vida que se dá .
Estes são factos vividos há poucos dias no mês de setembro e nada têm de ficção. É a vida mesma destes homens e mulheres, é a Vida de Crentes que decidiram viver numa absoluta e radical doação. É, sem dúvida, um testemunho que nos interpela a todos.