Minha doença surgiu em março de 1980, em Bahía Blanca. (Argentina). Eu tinha 24 anos e estava prestes a cursar o primeiro ano de teologia. Eu e meus coirmãos da comunidade de teólogos viajamos de Buenos Aires para passar alguns dias em Bahía Blanca e em Fortín Mercedes. Durante a viagem, passei mal e fui diagnosticado com apendicite. Fui operado e, três dias depois, desenvolvi uma gangrena gasosa na região afetada. Precisei passar por uma nova cirurgia e fiquei dois dias na UTI.
Após 15 dias, como meu estado ainda era crítico, fui transferido para o hospital Muñiz, em Buenos Aires, que era especializado em doenças infecciosas. Precisei fazer mais uma cirurgia, desta vez para controlar a gangrena. A infecção estava localizada nos pulmões e fiz duas drenagens. Mas a febre, que era um sinal de infecção, não cedia.
Os exames indicavam uma septicemia, o que significava que a infecção não se limitava mais a um órgão, mas havia passado para o sangue. Além disso, as análises indicavam que eu não possuía defesas no organismo (zero grau de imunidade) e o quadro piorou.
A falta de imunidade era causada pelos antibióticos muito fortes e pela debilidade física. Durante todo aquele período eu havia me alimentado apenas por sonda.
De acordo com o Dr. Zabalza, chefe da 5ª unidade de cirurgia do hospital Muñiz, a probabilidade de mortalidade em caso de septicemia, combinada à falta de imunidade, era de 100%.
No hospital Muñiz, passei por dois momentos críticos. O primeiro foi no dia 5 de abril, quando cheguei a me recuperar parcialmente, mas os médicos disseram aos meus pais que o caso era muito difícil e que não havia esperança de que eu sobreviveria. O segundo, no dia 18 de abril, quando, após passar a noite em coma, acordei pela manhã, conversei um pouco, pedi comida e, para surpresa dos médicos e das enfermeiras, a febre havia cedido. A partir daí minha recuperação foi muito rápida e completa.
Quatro dias depois, fui autorizado a ir para uma casa salesiana próxima ao hospital para continuar o processo de recuperação. A cada dois dias eu precisava ir ao hospital para tomar os medicamentos.
No final de maio tive alta e pude ir para a casa dos meus pais para completar a convalescença. Em outubro eu já jogava futebol com os alunos da escola agrícola salesiana da aldeia onde mora minha família. O Dr. Zabalza me apelidou de "o morto que fala"... E, como vocês podem ver, Zatti me curou muito bem.
É interessante acrescentar que foi precisamente em março de 1980 que se abriu, em Viedma, o processo diocesano pela causa do Sr. Zatti.
Por que minha recuperação é atribuída ao Sr. Zatti? Porque quando fui estudar teologia em uma comunidade de Bahía Blanca, os dois formadores que tive, o diretor P. Juan REBOK e o assistente, P. Emilio BARASICH (que chegaram a conhecer pessoalmente Zatti), começaram as novenas (foram três) e convidaram as demais comunidades e os conhecidos para rezar, pedindo a graça por intercessão de Zatti.
Quero agradecer à minha família, em especial à minha mãe, Olinda. Ela me acompanhou durante todo esse tempo, suportando com bravura toda a angústia da situação. E também aos muitos coirmãos que cuidaram de mim com carinho.
Toda vida humana é um milagre. Nem sempre estamos cientes disso. Olhamos apenas para a superfície e não percebemos o valor e a graça que é o fato de "estarmos vivos". Certamente a experiência de uma cura que desafia os prognósticos dos médicos acende em mim a certeza de "estar vivo por milagre", por pura bondade de Deus.
Esta experiência de dor e de doença basicamente me ensinou a olhar para a vida com outros olhos. Deus tocou minha existência de uma forma muito forte. Esta experiência extrema me ajudou a colocar as coisas na perspectiva correta e isso me ajuda a "relativizar" muitos problemas... Quando tenho alguma dificuldade ou quando perco um pouco a calma, basta transferir-me mentalmente para o hospital de Muñiz e tudo se tranquiliza...
A graça de estar vivo faz com que muitas coisas deixem de inquietar e perturbar. E convida a viver em constante gratidão a Deus, por seu amor e ternura.
Tive um primeiro contato com a história de Zatti no noviciado, em 1973, ao ler o livro do padre Entraigas “O parente de todos os pobres”, a primeira biografia do coirmão. Gostei muito de constatar que ser santo não consiste em ser perfeito ou em cumprir ações extraordinárias, mas em viver em atitude de serviço e disponibilidade para com os irmãos, especialmente os mais necessitados.
Estou impressionado com a simplicidade e a doação diária de Zatti. Seu temperamento sereno e seu traço amável, combinados com um senso de humor. Ele viveu com intensidade a espiritualidade salesiana do “empenhe-se por fazer-se amar”. E viveu também a essência do evangelho: ser uma pessoa capaz de amar, doando a vida nas tarefas cotidianas. Trata-se de um valor que impressiona muito os jovens, que naturalmente têm fortes sentimentos e desejos de solidariedade e doação em seus corações.
Concluindo: que Zatti interceda junto a Deus e a Dom Bosco para que, em nossa Congregação, surjam numerosos e santos coirmãos coadjutores.
Testemunho do P. Carlos Bosio